Nascida num lugarejo perdido, nas encostas rochosas de Campos Avias, Kalamata,Grécia. Lá estava mais uma "Maria", órfã de pai já no primeiro mês de vida. Do pai, ela herdou os olhos negros brilhantes que a acompanham até hoje nos seus quase 85 anos de vida. Não houve tempo para mais nada. Sua mãe,a jovem viúva Vasiliki, pressionada por parentes, casou-se novamente.
Maria, rejeitada pelo padrasto e até judiada, foi acolhida pela avó materna, Ekaterini, que se ocupou de sua educação e que lhe deixou como herança a "Fibra", palavra em desuso e de conteúdo quase extinto em nossos dias.
Maria,estudar? Pra que? Uma órfã não precisa de estudo. Era necessário, sim, que ela se acostumasse desde cedo aos trabalhos domésticos e aos trabalhos nos campos das oliveiras. Moça pobre, sem dote, não podia sonhar em se casar com um homem rico, nem ter uma vida de luxo e conforto.
Para chegar aos campos, as plantas daqueles pezinhos descalços de criança, pisavam em pedras escaldantes. Calçar sapatos? Somente aos domingos para ir à igreja. Não é à toa que ela até hoje,tem dificuldade em encontrar um calçado que se amolde aos seus pés judiados.
A pobreza, porém, não teve força para esconder a beleza que se
acentuava cada vez mais naquele ser que parecia abandonado pela sorte.
A moça alta, de corpo curvilíneo, cabelos escuros ondulados e olhos negros como as azeitonas que ela mesmo colhia, atraía os olhares de cada homem do lugarejo. O fato dela ser órfã e pobre, porém, pesava muito mais.Não havia amigas para ela. Afinal, quem quer ter como amiga a moça mais bonita do lugarejo?
Houve momentos difíceis de solidão e desencanto mas a jovem já estava forte, dura como as pedras que cercavam sua cidade. Ninguém conseguia abalar sua capacidade de sonhar. "Inferioridade" era palavra desconhecida em seu vocabulário. Era consciente de sua beleza e sabia ser sensual mesmo vestindo roupas simples de tecidos baratos.
Essa mesma sensualidade que dela exalava, apanhou desprevenido o jovem militar, recém chegado à cidade. Moço rico, de família importante, disputado pelas moças mais bonitas e ricas das redondezas, só poderia estar querendo uma aventura com a simples "Maria".
Os comentários da vizinhança não impressionavam a vovó, muito menos a jovem apaixonada. A vovó acreditava no amor dos dois. Ela própria havia ensinado Maria a ser uma mulher de personalidade marcante, com muito brio e força.
Eram duas mulheres contra a opinião formada de uma cidade. Não houve convenção que as fizesse sucumbir. A jovem órfã e sem dote, tinha o mesmo direito à felicidade que qualquer outra.
Não demorou a chegar aos ouvidos do pai do jovem militar, que seu filhos estava de caso com uma qualquer. O velho enfurecido, não mediu esforços para afastar o filho da "pé de chinelo". Ameaçou deserdá-lo, apresentou-lhe moças prendadas com grandes dotes, que poderiam aumentar o patrimônio da família.
Tudo em vão.
Para espanto geral, o jovem, acostumado a todas as mordomias, trocou sua privilegiada posição pelo amor de uma mulher que, além de bonita, tinha "garra" para enfrentar a vida ao seu lado. Seria uma companheira e não somente uma esposa.
Foi o acaso que uniu dois seres tão anti-convencionais? Não acredito.
Deserdado, sem trabalho e sem apoio, o ex-"filhinho de papai", após casar-se com Maria, viu-se meio perdido.Graças ao espírito aventureiro que só os jovens têm, o casal apaixonado já com um filho a caminho, entrou no primeiro navio que apareceu e rumou ao Brasil, terra longínqua e desconhecida.
Sua única bagagem era o amor que os unia e o intuito de procurar um futuro digno para os dois e para o filho que logo nasceria.
Desembarcar num país estranho, de idioma desconhecido, sem amigos e com pouco dinheiro, não foi fácil. O único jeito foi aceitarem o alojamento da imigração. De início houve um choque quando foram separados:homens de um lado, mulheres de outro. A única arma que o casal possuía era exatamente a união. O que fariam separados naqueles dormitórios pulguentos?
Passaram a noite num degrau, na rua, apavorados mas procurando alternativas melhores de sobrevivência.
Instalaram-se num quarto de cortiço pertencente a um português, que os recebeu com carinho.
Logo nasceu a filha, passei a existir, fruto de uma união anti-convencional de dois jovens incríveis, corajosos, que nunca se entregaram.
Eu não poderia deixar de externar o orgulho que sinto por ter tido o privilégio de ser continuação de tais seres.
Naquele quartinho de cortiço, os dois uniram-se mais ainda . Chegara mais alguém e eles não se viram no direito de fraquejar.
Daqueles dias até hoje, muita coisa aconteceu. Os momentos de dor e desespero não foram poucos. Quando sentiram que a filha poderia passar fome, pediram ajuda aos parentes na Grécia.A resposta foi:
-"Vocês escolheram o amor, agora virem-se".
Era exatamente a resposta que eles precisavam ouvir. os dois se agigantaram. Não posso acreditar na versatilidade de ambos. Trabalharam em tudo que apareceu. Não diziam :"-Não sei".
A mamãe transformou-se em bordadeira, costureira, modelista e comerciante brilhante . O papai , ex-militar, que nunca tivera outra profissão, virou técnico de máquinas de costura, guarda-noturno, trabalhou em joalheria e chegou a industrial vitorioso.
O caminho foi longo mas limpo e honesto.Não faltaram as quedas e o desânimo. O que é, porém, uma queda para quem construiu alicerces fortes e inabaláveis? Os recomeços sempre foram possíveis dada a fé em Deus e em si próprios.Os sonhos tornaram-se realidade.
Meu irmão nasceu em dias melhores mas também teve a oportunidade de aprender com a luta desses imigrantes gregos :nossos pais.
Não é por acaso que hoje, quando me vejo desanimada, sem forças, procuro logo reagir, não me entregar. Não tenho esse direito.
Afinal de contas, acredito que os "gens morais" também são herdados.
Com essa genética,dá para "tirar a vida de letra".
-Navio Provence, rumo ao Brasil-
(Xenophon, Maria e EU! Onde? Procurem!)
-Navio Provence, rumo ao Brasil-
(Xenophon, Maria e EU! Onde? Procurem!)
É uma história e tanto, de gente humilde, honesta e honrada. Pena que hoje em dia, existam tão poucas pessoas com este caráter.
ResponderExcluirParabéns pela história e pelo exemplo.
Viva Maria!
Obrigada pelas palavras, Nando.
ExcluirBeijos!
Que história linda...Mire-se sempre nesses 2 jovens lindos...A fé, Esperança e amor, sempre em 1º lugar...
ResponderExcluirÉ o que faço sempre.Isso nos fortalece.Vc também tem lindos exemplos né amiga?bjos
ExcluirTivemos ótimos exemplos e sua beleza tem DNA..bjão
ResponderExcluirObrigada Cris.Quanto a DNA você também não pode se queixar.bjos
ResponderExcluirQue historia mais linda Tacia!!!! Ideia pra novela de amor!!!!!!!!!!!!!!!!
ResponderExcluirPois é Aldinha.É verídica.Também acho linda.Afinal faço parte dela né???Filakia!
ExcluirTácia, muito boa a introdução de seus textos; bela reverência aos seus e o orgulho da história que é sua também. Despertarás interesse aqui, por isso espero que não diminuas o ritmo, com o passar do tempo. A esperança e o medo têm o mesmo poder sobre a vida humana: cada um constrói o seu próprio destino. O deles foi bonito, espero que possas gostar muito do seu também! Parabéns, filakia!
ResponderExcluirVanda,você sempre sensível e carinhosa.Sei o quanto você é ligada à Grécia e,com certeza, sempre encontrará algo que vá de encontro à sua alma.Beijo carinhoso.
ResponderExcluirQue linda história Tácia...seus pais eram lindos e nobres. Está explicada sua beleza, com certeza sua força também.
ResponderExcluirum beijo.
Beth.
Tenho muito orgulho deles Beth.Foi uma jornada muito digna e vitoriosa.Você sabe bem o que é dignidade porque é uma das mulheres mais dignas e guerreiras que conheço.
ResponderExcluirLindo, lindo de viver e amar!
ResponderExcluirTodos nós filhos de gregos,temos histórias lindas p contar.Vc com certeza,tem a sua.Obrigada por ler.beijos Cris.Só vi hoje seu comentário.
ExcluirVerdadeiro Conto de Fadas e Príncipes valentes.
ResponderExcluirComo você disse,o exemplo deles serve de lição de determinação.
Desânimo é uma palavra fora do seu dicionário
Tácia...que história forte e que só reforça que o amor vence todos os obstáculos.
ResponderExcluirParabéns pra você e para sua mamãe neste dia de comemoração das mães porque na verdade o que vale são todos os dias que elas nos ajudam a sermos fortes e integras como elas. Beijos!
Tarcisio Quintão e Lana ,realmente temos muito orgulho da nossa mãe .Essa força que ela teve não nos deixa fraquejar diante dos percalços da vida.beijos e obrigada pelo carinho.
ResponderExcluirQuerida, fiquei tocada! Lindíssimo exemplo o dos seus pais. Exemplo de determinação, união, companheirismo e muito amor. E belíssimo exemplo o seu também. Exemplo de reconhecimento, respeito e apreço pelo legado moral que os seus pais te transmitiram.
ResponderExcluirFiquei muito feliz em ler este relato. Relatos como este fazem bem a alma.
Maravilhosa história de amor e perveranca obrigado por existir pessoas assim com garra e determinação coisa rara nos dias de hoje
ResponderExcluirO que dizer de um texto que de tão bem escrito nos transporta para dentro da história como se lá estivéssemos observando a sequência de horas tristes e horas de vitórias. Texto que nos remete aos mistérios da vida a importância da fé e a coragem de levar um sentimento adiante sem dar importância as opiniões contrárias e ao descrédito pela diferença social. Mãe de nome forte aguerrida desde o nascimento. Pai que honrou o fio do bigode e fez de um sentimento seu sentido de vida, você fruto e celebração dessa união que com certeza foi desejada e muito amada por estes e que hoje presta essa homenagem para todos os envolvidos não deixando que memórias tão belas e fortes caiam no esquecimento como tantas outras que ficam no caminho por não haver quem as reconheça. Sem conhecer sua avó, mãe e pai é possível ver muito deles ao fazer uma conexão entre o que foi escrito e sua personalidade. Tão forte quanto aos que lutam são os que reconhecem cada batalha. Que você e sua geração sigam abençoadas e continuem a divulgar uma história tão linda e motivadora para os desacreditados das reviravoltas da vida, para os incrédulos que não acreditam no poder de Deus e para aqueles que acham que para serem felizes é necessário agradar o olhar do próximo como se suas vontades junto com a fé não fossem possível adquirir conquistas inimagináveis.
ResponderExcluirQuem escreveu esse comentário tão lindo? Vc me emocionou! Agradeço.
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